Receita e PF fecham o cerco contra sonegação no setor de cigarros

Plantão | Publicada em 10/10/2006 às 10h25m
O Globo

BRASÍLIA - Agentes da Polícia Federal e fiscais da Receita realizam desde o início da manhã desta terça-feira uma operação para cumprir 135 mandados de busca e apreensão e 116 mandados de prisão em onze estados contra a sonegação de impostos no setor de cigarros. Denominada "Bola de Fogo", a operação tenta desarticular grupos que atuam irregularmente na produção e comercialização de cigarros. As investigações começaram há um ano.

Uma das indústrias do grupo está sendo fechada pela Receita Federal devido ao cancelamento do registro especial para fabricação de cigarros pela prática reiterada de sonegação de impostos. Esta indústria se associou a outros grupos distribuidores para promover, em quase todo o território nacional, a fabricação e distribuição de cigarros sem selo de controle, sem documentação fiscal ou com documentação fiscal irregular.

Há indícios de que os grupos investigados utilizavam inúmeras empresas de fachada e "laranjas", e corrompia servidores públicos para montagem de um esquema de proteção em organismos fiscais e policiais. A investigação apontou um esquema de introdução clandestina no país de cigarros produzidos no Paraguai, sem pagamento de tributos. Difícil de ser calculada com precisão, a sonegação pode ser estimada em centenas de milhões de reais. Um dos grupos possui aproximadamente R$ 800 milhões em débitos tributários não pagos à Receita Federal.

Nas investigações, ficou evidenciada a atuação de parte da organização no contrabando e descaminho de gado, pneus, armas e drogas, cuja origem ou procedência são países fronteiriços como Paraguai, Bolívia e Uruguai. Com negócios nos dois lados da fronteira e contando com um universo de "laranjas", o líder do grupo controlaria contas bancárias em diversos países, atuando como intermediário no pagamento dos cigarros comprados clandestinamente no Paraguai, além de controlar uma rede de empresas usadas para lavar o dinheiro.

A sede da operação é Campo Grande (MS)), mas os 750 policiais federais estão espalhados por Rio Grande do Sul, São Paulo, Paraná, Goiás, Rio Grande do Norte, Pará, Mato Grosso, Maranhão, Ceará, Rio de Janeiro, além do Mato Grosso do Sul. Nos últimos dois anos, a PF apreendeu mais de 23 mil caixas de cigarros do grupo, avaliadas em aproximadamente R$ 13 milhões. Entre os crimes cometidos estão contrabando, descaminho, sonegação fiscal, corrupção ativa e passiva, exploração de prestígio, falsidade ideológica, evasão de divisas, lavagem de dinheiro e ocultação de ativos ilícitos.

A apuração da Polícia Federal detectou a existência de três grandes organizações criminosas envolvidas no esquema. A primeira é chefiada por Hyran Georges Delgado Garcete, responsável pela introdução em território nacional de grande quantidade de cigarros contrabandeados, além de armas e drogas. Com a ajuda de parentes e funcionários que faziam o papel de "laranjas", ele abriu várias empresas no ramo da construção civil, de importação e exportação, e transportadoras para acobertar transações comerciais ilícitas.

Boa parte do cigarro negociado por Garcete era de propriedade de outra organização criminosa, encabeçada pela empresa Sudamax Indústria e Comércio de Cigarros Ltda, que está instalada na cidade de Cajamar (SP). Ela comercializa no país as marcas US, U5, Dollar, Campeão, Vanguard e Dunas, e para exportação os cigarros das marcas Mack e Red Fox. A Sudamax tem uma fábrica "espelho" no Paraguai chamada de Tabacalera Sudan SRL. Esta fábrica paraguaia é responsável pela produção dos cigarros da marca US Mild, de grande aceitação no mercado nacional.

Durante as investigações constatou-se que os cigarros US Mild também são produzidos na própria Sudamax em Cajamar, num processo conhecido dentro da empresa como "operação Dunas". Nesta operação, o objetivo é dissimular a origem do produto, colocando o produto no mercado nacional como se ele tivesse sido "contrabandeado" do Paraguai. Prova da irregularidade foi a apreensão de 8.200 caixas dos cigarros US Mild feita por policiais federais no dia 12 de maio, no interior da empresa em Cajamar. O dinheiro ilícito acaba sendo investido em empresas do grupo que atuam no setor imobiliário e empresas offshore sediadas no Uruguai, configurando assim o crime de lavagem de dinheiro.

O acompanhamento das atividades da empresa Sudamax indicaram a existência de uma terceira organização criminosa, encabeçada pela Distribuidora de Alimentos e Produtos de Consumo Dunas, sediada em Natal (RN). Os sócios-proprietários da empresa coordenam um esquema especializado na distribuição atacadista de cigarros, adquiridos no Paraguai (tanto da Tabacalera Sudan quanto em outras tabacaleras) e na Sudamax (cigarros US MILD). Outra empresa que tinha o cigarro distribuído pelo grupo era a Tabacalera Central, dos irmãos Roque e Roni Silveira.

O esquema de distribuição usava como base as cidades de São Paulo e Anápolis, e envolvia uma rede de proteção, normalmente corrompendo policiais, fiscais e outras autoridades públicas. A suspeita da PF é que esta organização criminosa tenha substituído Roberto Eleutério da Silva, o Lobão, no comércio ilegal de cigarros. Lobão foi preso pela Polícia Federal em setembro de 2003 sob a acusação de ser o maior contrabandista de cigarros do Brasil.

Fonte: O Globo on line em 10-10-2006.