A agricultora Eva da Silva, de 61 anos, se suicidou após
ter tido toda a sua produção de fumo tomada pela fumageira
Alliance One. O fato ocorreu na última sexta-feira (2), no
município de Vale do Sol, região do Vale do Rio Pardo, a 195
km de Porto Alegre (RS).
A justiça de Vale do Sol havia
determinado o arresto da produção de fumo da agricultora, como
pagamento de uma suposta dívida que ela teria com a empresa,
para quem vendia fumo há mais de 25 anos. Notas de compra e
extratos, colhidos pelo Movimento dos Pequenos Agricultores
(MPA), mostram que Eva da Silva só possuía dívidas futuras,
que ainda não estavam vencidas, e demonstram um histórico a
favor da agricultora, por sempre ter honrado os compromissos
assumidos com a multinacional. No mês de dezembro, ela havia
remetido parte de sua safra para a Alliance One, recebendo o
valor integral pelo fumo vendido, justamente por não ter
débitos pendentes.
Na manhã de sexta, um oficial de
justiça, policiais e funcionários da multinacional começaram a
carregar a safra da agricultora. Desesperada, ela anunciou que
iria se matar, mas não foi ouvida. Morreu por enforcamento, às
9h30. O fato está registrado na Delegacia de Polícia de Vale
do Sol. No atestado de óbito, o médico responsável indica que
a agricultora se suicidou devido ao arresto do fumo. Ela
também sofria de depressão, comum entre os fumicultores da
região, em razão da alta carga de agrotóxicos utilizada na
lavoura de fumo.
Se não bastasse a trágica morte da
agricultora, o MPA denuncia que, mesmo depois de constatada
sua morte por enforcamento, a operação não parou. Foi
solicitado reforço aos trabalhadores da Alliance One, para
terminar o mais rápido possível o carregamento, numa prova
inequívoca de que as fumageiras não dão valor à vida
humana.
O arresto de fumo, por determinação da Justiça,
tem se tornado cada vez mais comum nas regiões fumicultores do
Rio Grande do Sul. "Trata-se de uma prática arbitrária, que as
indústrias costumam solicitar quando se dizem ameaçadas em não
receber os débitos do agricultor, usando de mentiras e
induzindo o Poder Judiciário ao erro, como no caso de mais
essa vítima fatal", afirma nota oficial da direção do
MPA.
O movimento deve encaminhar a denúncia a entidades
de defesa de direitos humanos e ao Ministério Público Federal.
"Recorrer com à força policial é ultrajante e vergonhoso para
os agricultores, ainda mais como no caso, em que a fumicultora
que cometeu suicídio não tinha dívidas acumuladas com a
Alliance One", diz a nota do MPA.
O Movimento de Pequenos Agricultores – MPA, torna
público:
As notícias que vêm da região de Santa Cruz do
Sul/RS são trágicas, e é com tristeza que o Movimento dos
Pequenos Agricultores - MPA reitera as denúncias que realiza
contra as práticas das indústrias fumageiras.
A questão
emergente que vamos enfrentar em todas as instâncias cabíveis
ocorreu no município de Vale do Sol/RS, onde uma fumicultora
de 61 anos, que há cerca de 25 anos integrada a uma mesma
indústria, a Alliance One, cometeu suicídio enquanto teve sua
propriedade tomada por policiais, oficial de justiça e
funcionários da multinacional que lá foram para levar o seu
fumo, sob a alegação de “quebra de
contrato”.
Visivelmente abalada e implorando para que
parassem com o arresto, inclusive, dizendo que diante do fato
iria se matar, ela não foi ouvida pelo oficial de justiça e
demais cumpridores do mandado judicial, que nada fizeram para
impedi-la. Mesmo depois de constatada sua morte por
enforcamento a operação não parou. Foi solicitado reforço aos
trabalhadores da Alliance One, para terminar o mais rápido
possível o carregamento, numa prova inequívoca de que as
fumageiras não dão valor à vida humana. Para o desespero dos
familiares e da comunidade local, os cumpridores da ordem
judicial continuaram servindo aos interesses da multinacional,
diante da fumicultora dependurada pelo pescoço.
O MPA é
contrário à prática do arresto em quaisquer circunstâncias.
Entendemos que as indústrias fumageiras, com todo o seu
poderio econômico, possuem outros meios para receber seus
créditos. Recorrer com a força policial é ultrajante e
vergonhoso para os agricultores, ainda mais como no caso, em
que a fumicultora que cometeu suicídio não tinha dívidas
acumuladas com a Alliance One.
Documentos em posse do
MPA comprovam que ela só tinha dívidas futuras, que ainda não
estavam vencidas e demonstram todo um histórico a seu favor,
por sempre ter honrado os compromissos assumidos com a
multinacional. Além disso, a agricultora não se recusara a
entregar o fumo, tanto que em dezembro último havia remetido
parte de sua safra para a fumageira e recebeu o valor integral
pelo fumo vendido, justamente por não ter débitos
pendentes.
Trata-se de uma prática arbitrária, que as
indústrias costumam solicitar quando se dizem ameaçadas em não
receber os débitos do agricultor, usando de mentiras e
induzindo o Poder Judiciário ao erro, como no caso de mais
essa vítima fatal. A penhora do fumo, como garantia dos
financiamentos conferidos pelas fumageiras, está prevista nos
contratos, que são ilegais e "leoninos". Feitos por adesão e
cheios de má-fé, sem qualquer negociação com os fumicultores,
servem mais como um tipo de regimento do “sistema de
integração”. Os fumicultores assinam esses documentos, de
boa-fé e sem conhecimento das cláusulas, inclusive
promissórias e procurações em branco, que depois são usadas
contra eles. É obedecer ou se ver impedido de seguir na
atividade.
O objetivo do MPA é aprofundar o debate
acerca dos contratos de compra e venda do fumo para fazer uma
discussão, mais à fundo, sobre o sistema de integração rural.
Uma verdadeira servidão moderna que vem consumindo não só a
força de trabalho de famílias inteiras, mas também consumindo
a vida dos pequenos agricultores.
Santa Cruz do
Sul/RS Direção Estadual, Movimento de Pequenos Agricultores
MPA
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