Ação pede fim de parceria
com Souza Cruz
SILVANA DE FREITAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A polêmica sobre a utilização de dinheiro privado,
da indústria de cigarros Souza Cruz, na informatização
do Judiciário brasileiro chegou à Justiça. Dois
procuradores da República em Brasília pediram a suspensão
do programa do Poder que recebe R$ 2,4 milhões da empresa.
A 22ª Vara da Justiça Federal em Brasília está
para decidir se concede ou não liminar suspendendo o programa.
Ela foi pedida em ação civil pública movida pelos
procuradores José Alfredo de Paula Silva e Raquel Branquinho
contra a União, a FGV (Fundação Getúlio
Vargas) e a Souza Cruz, parceiras nessa iniciativa.
A Secretaria de Reforma do Judiciário, do Ministério da
Justiça, a Escola de Direito do Rio de Janeiro da FGV e a Souza
Cruz criaram em novembro de 2004 o fundo "Justiça Sem Papel",
composto exclusivamente por recursos dessa empresa. O fundo custeará
projetos elaborados pelos próprios juízes e que custem
até R$ 300 mil. O gasto poderá chegar a R$ 1,5 milhão.
O restante da verba será usado no processo de seleção
das melhores propostas.
Ao saber da ação, o secretário da Reforma do Judiciário,
Sérgio Renault, disse que não vê nenhuma irregularidade
na captação de recursos privados para modernização
do Judiciário. Em informações prestadas aos procuradores,
esse órgão e a FGV disseram que o programa tem natureza
privada e que não há uso de nenhum recurso público,
o que o legitimaria.
Ação
A ação começou a ser preparada em novembro no Ministério
Público Federal em São Paulo, após a Folha publicar
reportagem anunciando a injeção de dinheiro da indústria
de cigarros na Justiça.
A Folha teve acesso à cópia da ação. Os
procuradores argumentam que a iniciativa não tem amparo legal
e que viola os princípios constitucionais da independência
e da imparcialidade da Justiça.
Eles sustentam que esse é um "perigoso precedente",
porque o exemplo poderá ser seguido em outros projetos. Por fim,
lembram que a Souza Cruz é uma "litigante profissional",
ou seja, tem interesse em causas judiciais.
"Todos os recursos utilizados no Poder Judiciário devem
ser provenientes do erário, isto é, devem advir do orçamento
público, a partir da arrecadação de tributos e
de outras fontes legalmente previstas", dizem. "Assim, não
é de se admitir que a jurisdição seja financiada
por recursos privados, máxime oriundo de uma empresa que é
parte em inúmeros processos que tramitam nos nossos tribunais,
tanto na condição de autora como de ré."
Independentemente da obtenção da liminar, eles pediram
que, no mérito, a Justiça declare o programa nulo e condene
a FGV e a Souza Cruz a pagar indenização no valor gasto
até então.
O projeto "Justiça sem Papel" foi lançado em
12 de novembro de 2004, em Brasília. O prazo para os juízes
fazerem propostas de informatização foi prorrogado de
28 de fevereiro para 31 de março.
O objetivo é estimular a criação de juizados e
varas onde o processo será virtual, ou seja, os autos estarão
disponíveis só em meio eletrônico, não mais
em papel.
Os juízes poderão sugerir inovações tecnológicas
como banco de dados, sistemas estatísticos, desenvolvimento de
softwares e compra de computadores.
Fonte: Folha de São Paulo em 25-03-2005.