São Paulo, quinta-feira, 08 de março de 2007
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Menos cigarro produz revolta, diz chinês

Segundo deputado, antitabagismo favoreceria repetição do colapso soviético; fumo mata por ano 1,2 milhão de chineses

China é maior produtor e consumidor de nicotina; dos viciados, 50 milhões são adolescentes; maço mais barato custa apenas R$ 0,70

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

A estabilidade social chinesa estará ameaçada caso o governo tente diminuir o número de fumantes, afirmou ontem o deputado Zhang Baozhen, que é também o vice-presidente do Monopólio Estatal de Tabaco.
Em discurso na sessão anual do Parlamento, ele disse que "fumar faz mal à saúde, mas restringir o consumo de cigarros ameaça a estabilidade social". A seu ver, "os fumantes promoveram distúrbios urbanos quando a ex-União Soviética entrou em colapso, porque eles não conseguiam mais comprar cigarros". Ele acredita que seu país estaria agora exposto ao mesmo perigo.
A China é a maior produtora e consumidora mundial de cigarros, com cerca de 2 trilhões de unidades por ano. Uma lei em vigor proíbe que motoristas fumem ao volante, mas ela é soberbamente desrespeitada.

320 milhões de viciados
Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), há na China 320 milhões de dependentes -um terço dos estimados em todo o mundo. Cerca de 50 milhões de fumantes são adolescentes. Cerca de 1,2 milhão morre anualmente por moléstias derivadas do tabagismo, que era responsável por 12% das mortes de adultos em 2000, e que pode chegar a 33% dentro de 13 anos.
O Partido Comunista Chinês tem procurado conter protestos contra a corrupção, contra acidentes ambientais e também contra o crescente fosso que se abriu entre os mais ricos e os mais pobres. Zhang procurou bater nessa tecla.
Também em Pequim, e numa proposta em sentido oposto, segundo o jornal "Diário do Povo", um dos deputados presentes na sessão do Parlamento - seu nome é Huang Jun - propôs o aumento de impostos como forma de inibir a dependência do fumo. A arrecadação obtida com a cobrança suplementar seria canalizada para programas de tratamentos de moléstias derivadas do tabagismo.
Huang é vice-diretor de uma faculdade de medicina em Jiangsu e, a seu ver, o cigarro matará 2 milhões de chineses em 2025 caso o governo permaneça de braços cruzados.
O jornal chinês em língua inglesa "East Day" diz que a indústria local de tabaco entra com 60% do volume arrecadado com o imposto que equivale ao ICMS brasileiro.
Ou, segundo a OMS, o imposto sobre os cigarros permite uma arrecadação anual de mais ou menos um décimo dos impostos diretos que o governo local cobra dos chineses.
Estudo publicado pelo Centro de Estudos Econômicos da Universidade de Pequim revela que o tratamento por doenças provocadas pelo tabagismo custa cinco vezes mais que o imposto arrecadado.

Fumar é barato
O consumo continua a crescer, mesmo porque se trata de um produto extremamente barato. Um maço de cigarros com 20 unidades sai no varejo por algo a partir de R$ 0,70.
O "East Day" assinala que a existência de um monopólio estatal para o setor é um desestímulo à concorrência, que teria interesse em pesquisar para baixar o teor tóxico do cigarro.
O produto estrangeiro, de mais baixo teor e cuja importação é há três anos possível pelo fato de a China ter ingressado na OMC (Organização Mundial do Comércio), ainda representa uma parcela pequena do consumo interno. As empresas mais agressivas nesse imenso mercado são as americanas, que assim compensam amplamente a queda de suas vendas nos Estados Unidos.
O governo chinês assinou em 2003 o FCTC, sigla de uma convenção da Organização Mundial da Saúde que sinaliza o compromisso de forçar a baixa do consumo de cigarros.
Segundo ainda a OMC, o fumo é hoje a segunda maior causa de mortes no mundo, com 5 milhões de vítimas por ano. Caso o tabagismo se mantenha em seus atuais patamares, o número de óbitos dobrará até 2020.


Com agências internacionais


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