Edição 1953 . 26 de abril de 2006

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Comportamento
É proibido fumar

...em bares, escritórios, restaurantes,
praias e agora até ao ar livre


Bel Moherdaui


Daniel Ochoa de Olza/AP
Não pode: no metrô de Madri e em qualquer lugar fechado da Espanha

No começo, era coisa de americano. Os bacanas, os ilustrados, os independentes, todos continuavam a fumar furiosamente. O passar do tempo mostrou que eram apenas viciados. Em trinta anos, se tanto, foram monumentais os resultados da campanha antitabagista que conseguiu mudar hábitos e costumes em nível planetário. De gesto glamouroso, sexy, decidido, exaltado em filmes de Hollywood e anunciado com fanfarra em toda parte, o ato de fumar, uma vez comprovados os danos à saúde de quem fuma e de quem está por perto, passou a ser coisa execrada, migrando da boca dos mocinhos e mocinhas para a dos bandidos. Dos Estados Unidos, berço da guerra ao cigarro, a campanha antifumo ganhou o mundo. Nos últimos seis meses, novas vitórias foram alcançadas. Escócia, Uruguai e Espanha colocaram em prática algum tipo de restrição – com maior ou menor adesão da população. Em 2007, entram em vigor leis antifumo já aprovadas na Irlanda do Norte, Inglaterra e Porto Rico. A França, um dos últimos bastiões dos fumantes explícitos, anunciou que dará início a uma consulta popular sobre a proibição do fumo em lugares públicos (surpreendente resultado de uma pesquisa de opinião: 78% dos franceses apóiam a medida, com a aprovação variando de acordo com o local onde os consultados acham que deve vigorar). Até a China, onde se fuma um terço de todos os cigarros consumidos no mundo, está tomando providências para proibir a construção de novas fábricas de cigarro. Nos Estados Unidos, um sinal claro de que o proibicionismo total é o futuro enfumaçado que espera os fumantes foi dado em Calabasas. Nessa cidade de 25 000 habitantes, na (onde mais?) Califórnia, desde 17 de março é proibido acender um cigarro em qualquer lugar aberto onde a fumaça possa incomodar outra pessoa, aí incluídos parques, ruas, a varanda da casa do fumante e seu próprio carro, se o vidro estiver aberto. "Legitimamos uma reivindicação que causava muito embaraço: 'Dá para apagar o cigarro?'. Nós colocamos uma lei por trás dela", explica o prefeito da cidade, Barry Groveman.


Fotos Lucas Jackson/Reuters
Reuters
O prefeito de Calabasas (à esq.) anuncia: cigarro, nem na varanda da própria casa

Pelas contas de Groveman, para cada cidadão contrário ao veto, oito são a favor. Quem descumprir será primeiro notificado, depois multado, mas neste primeiro mês de implantação da nova regra ninguém sofreu punição alguma. "No momento estamos concentrados em educar as pessoas. Esperamos não ter de multar ninguém, mas lidaremos com as violações caso a caso", disse a VEJA Michael Hafken, secretário de Comunicação da cidade. Qual a lógica de proibir o fumo em ambientes abertos? Nenhuma, exceto o puritanismo americano (bem, é melhor não exagerar na crítica, pois é possível que sigamos pelo mesmo caminho). "Já está mais do que provado que a incidência de câncer de pulmão em cônjuge de fumante é quatro a cinco vezes maior. Mas isso, em ambientes fechados. Não temos prova de que a fumaça em lugar aberto cause algum mal a quem estiver por perto", comenta o pneumologista Hélio Romaldini, professor adjunto da Universidade Federal de São Paulo. Calabasas é o primeiro caso de banimento do cigarro em uma cidade inteira, mas a interdição em espaços abertos não é novidade. Já é proibido fumar na maioria das praias do sul da Califórnia e em algumas da Austrália.

"O mundo acordou para o problema do tabagismo passivo", comemora Tânia Cavalcante, coordenadora do Programa Nacional de Controle do Tabagismo do Instituto Nacional de Câncer do Ministério da Saúde. Acordar, porém, não quer dizer que as leis não sejam adaptadas às culturas locais. No Brasil, fumar dentro de shopping centers é proibido desde 1996; até hoje, porém, os seguranças do Shopping Iguatemi em São Paulo, por exemplo, andam com cartõezinhos no bolso – que entregam a fumantes explícitos – informando gentilmente sobre a proibição e indicando os locais onde o cigarro é permitido. Na Itália, os donos de bares e restaurantes rebelaram-se abertamente contra a lei antifumo implementada em janeiro de 2005: avisaram que não iam cumpri-la porque o hábito de fumar nesse tipo de estabelecimento faz parte da cultura italiana. São, no entanto, rebeldes de uma causa perdida. Em artigo publicado na semana passada, o colunista americano William Saletan avaliou que a guerra contra o fumo está ganha, com folga. Tanto que os guardiões da moral e dos bons hábitos já partiram para nova empreitada. Seu alvo: os alimentos gordurosos, que engordam e contribuem para a obesidade, que caminha para substituir o fumo como a maior causa de mortes evitáveis nos Estados Unidos. Fãs de hambúrguer com fritas, preparem-se.

 

 
 
 
 
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