Supremo discute hoje súmula para caça-níquel

STF deve criar jurisprudência contra leis estaduais que autorizam bingos e impedir que juízes de instâncias inferiores liberem máquinas por liminar

Mariângela Gallucci, BRASÍLIA

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) marcaram para hoje a reunião em que devem revisar as versões finais das cinco primeiras súmulas vinculantes que serão editadas pela Corte e terão de ser seguidas pelos juízes das instâncias inferiores. Uma das mais aguardadas dará a jurisprudência do Supremo sobre a exploração de bingos e caça-níqueis.

"Os primeiros verbetes são tranqüilos", afirmou ontem ao Estado o ministro Marco Aurélio Mello, presidente da Comissão de Jurisprudência do STF. Segundo ele, há uma expectativa de que as súmulas, depois de revisadas, sejam aprovadas esta semana. Com a edição da norma sobre bingos, o Supremo espera impedir que magistrados concedam liminares a empresários para manter as casas de jogo abertas. A aprovação também compensa a falta de uma lei federal, aprovada pelo Congresso, para regulamentar o jogo ou proibi-lo de vez.

No mês passado, a Operação Hurricane da Polícia Federal revelou um esquema de venda de decisões judiciais pró-bingos, com suspeitas de participação de desembargadores e até do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Paulo Medina. Tramita no STF um inquérito com toda a investigação.

As liminares que garantem o funcionamento casas de jogos geralmente são concedidas com base em leis estaduais, apesar de o Supremo ter decidido, reiteradas vezes, que essas normas são inconstitucionais. Segundo o tribunal, apenas a União - desde que exista uma lei para isso - pode autorizar a exploração dessa atividade.

A mais recente das decisões da principal Corte brasileira sobre o assunto foi tomada na quinta-feira da semana passada, quando se derrubaram leis de Goiás que disciplinavam os serviços de loteria e similares naquele Estado. Na ocasião, o ministro Marco Aurélio Mello disse que o tema está "pacificado" no tribunal e não há impedimentos para a edição de uma súmula. "O STF bateu o martelo no sentido de que somente a União pode legislar sobre jogos", afirmou.

OUTRAS NORMAS

Autor de várias ações que resultaram na derrubada de leis pró-bingos, o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, disse que a aprovação de uma jurisprudência sobre bingos tirará "qualquer dúvida de que lei estadual não poder dispor sobre esse tipo de atividade".

Além da súmula sobre bingos, os ministros do STF deverão aprovar a edição de enunciados jurídicos sobre Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), ações por acidentes de trabalho, direito de defesa em processos no Tribunal de Contas da União (TCU) e base de cálculo e aumento da alíquota da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).

AS CINCO SÚMULAS

Loterias e bingos: o STF vai dizer que as leis estaduais são inconstitucionais

Processo no TCU: vai dizer que processos administrativos do Tribunal de Contas da União têm de respeitar o direito ao contraditório e à ampla defesa

Créditos do FGTS: a súmula vai referendar lei que autoriza a Caixa a fazer depósitos nas contas vinculadas do FGTS

Cofins-alíquota: STF vai dizer que o aumento de 2% para 3% é constitucional

Cofins-base de cálculo: a súmula vai dizer que a Receita não pode cobrar Cofins sobre as receitas financeiras das empresas

Fonte: OESP em 07-05-2007.

Congresso evita legislar sobre bingos

Luciana Nunes Leal

Desafiado pelo Judiciário e pelo Executivo a fazer uma lei que aprove ou proíba de uma vez por todas o jogo no Brasil e ponha um ponto final na polêmica sobre o funcionamento de bingos e caça-níqueis, o Congresso dá sinais de que prefere manter distância do assunto.

Apesar da investigação em cima de juízes envolvidos com os empresários do jogo, bingos e bicho - e do escândalo Waldomiro Diniz, que retirou o poder de iniciativa do Executivo para propor uma lei -, o Congresso está a caminho do quinto mês de trabalho sem apresentar nenhuma proposta para o futuro dos bingos. E os projetos velhos, alguns na Câmara desde 1991, estão escanteados: ou esperam pela indicação de relatores ou por pareceres de comissões.

Há dez projetos em tramitação na Câmara a favor da legalização do jogo - e outras sete propostas para chancelar a proibição em definitivo.

Autores das propostas pró-legalização acusam os colegas de 'hipocrisia', mas o sentimento majoritário do Congresso, depois de dois escândalos de jogo no intervalo de três anos, é a favor de não mexer no assunto e manter as tramitações em banho-maria.

'É daqueles temas em que há polêmica dentro dos partidos. Agora, temos que tratar é de reforma tributária e reforma política, que estão queimando nas nossas mãos', diz o líder do PR na Câmara, Luciano Castro (RR), integrante da base do governo.

'Defender a legalização do jogo agora, só se for para apanhar', constata o senador Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), relator da CPI dos Bingos, um exemplo recente da inércia do Congresso Nacional diante do dilema sobre legalizar ou proibir o jogo de azar.

Depois de um ano em que se investigou até o assassinato do ex-prefeito de Santo André Celso Daniel, a comissão aprovou, em junho do ano passado, um relatório sem efeitos práticos. Garibaldi chegou a preparar um projeto que legalizava os bingos, mas foi convencido por senadores contrários ao jogo, como Romeu Tuma (DEM-SP) e Magno Malta (PR-ES), a apenas citar propostas.

Para Garibaldi, a ação da Polícia Federal na Operação Hurricane 'revelou um aparato (esquema de jogos ilegais) devastador'. Sem solução de curto prazo para o Congresso abraçar a causa em favor de uma decisão pública, o ex-relator da CPI dos Bingos se confessa 'em dúvida'. 'Ainda acho que primeiro seria necessário fazer uma limpeza geral. Depois, aí sim, talvez pudesse ser aprovada uma legislação enquadrando os bingos, que ficariam submetidos a forte fiscalização.'

Fonte: OESP em 06-05-2007.


Máfia italiana trouxe 35 mil caça-níqueis ao Brasil

Com as máquinas, lavou R$ 34 milhões obtidos com o tráfico de drogas

Wilson Tosta

Mafiosos italianos trouxeram ao Brasil pelo menos 35 mil caça-níqueis, numa ampla ação de lavagem do dinheiro obtido com o tráfico de drogas, nos anos 90. Foram pelo menos US$ 17 milhões (R$ 34 milhões) investidos, segundo apurou a Operação Mau Olhado da Direção Anti-Máfia da Procuradoria da República da Itália.

No Brasil, o fornecedor das máquinas era o empresário Alejandro de Viveiros Ortiz, que - segundo a CPI da Loterj, da Assembléia do Rio - tinha ligações com José Renato Granado Ferreira, hoje vice-presidente da Associação de Bingos do Estado (Aberj), recentemente preso na Operação Hurricane. Seu advogado disse desconhecer qualquer tipo de atividade ilegal

Os procuradores italianos Giovanni Salvi e Pietro Salviotti afirmaram em relatórios na época que o investimento nos caça-níqueis constituiu um dos seis caminhos dos mafiosos para legalizar o que ganhavam com cocaína e heroína. O dinheiro era lavado por Lillo Lauricella, ligado a Fausto Pellegrinetti, que teria escolhido o Brasil para a operação. Lauricella atuava em favor da família di Corleone, do chefe mafioso Totó Riina. Mais de 50 pessoas foram condenadas, na Itália, pelos crimes investigados na Mau Olhado. Não consta dos processos, como condenado ou acusado, nenhum Ortiz.

Em seu relatório, procuradores acusaram quatro empresas, todas de São Paulo: Bingo Matic, Betatronic, Nevada e "Fábrica". Na Bingo Matic, Ortiz era sócio. Segundo os procuradores, outro sócio era Giuseppe Aronica, que também integrou a Betatronic, onde era sócio, justamente, de Lauricella.

Em defesa de Ortiz, o advogado Daniel Bialski afirmou em 2004, em meio ao caso Waldomiro Diniz, que o inquérito no Brasil sobre a família Ortiz fora arquivado em 2003, por falta de provas. Ele reconheceu que os Ortiz conheceram Lauricella, mas nunca desconfiaram de atividades ilegais do italiano.

Fonte: OESP em 06-05-2007.

20 dias após 1º contato, caça-níquel é liberado

Escutas da PF revelam negociações de irmão de ministro com suspeitos

Vannildo Mendes, Roberto Fonseca, Sônia Filgueiras e MArcelo Auler

Entre os primeiros contatos da organização que explora caça-níqueis com o advogado Virgílio Medina, irmão do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Paulo Medina, e a concessão de liminar, liberando equipamentos apreendidos, passaram-se 20 dias. Os detalhes das negociações foram captados por escutas da Polícia Federal, na Operação Hurricane, que investiga a venda de sentenças judiciais.

As interceptações telefônicas, às quais o Estado teve acesso (veja ao lado), começaram antes, em 5 de julho de 2006. Naquele momento, o grupo se organizava para obter decisão judicial e liberar 900 caça-níqueis da Betec apreendidos pela PF. O primeiro contato, segundo a investigação, foi no Tribunal Regional Federal da 2ª região (TRF-2). O desembargador José Eduardo Carreira Alvim, um dos denunciados no esquema, concedeu liminar liberando os equipamentos, mas o Ministério Público recorreu e a decisão foi suspensa.

O grupo, então, protocolou reclamação no STJ, que ficou com o ministro Medina. De acordo com as investigações, o contato com Virgílio foi intermediado pelos empresários Jaime Garcia e Evandro Fonseca, os advogados Sérgio Luzio e Silvério Nery Júnior, os donos da Betec José Renato Ferreira e Belmiro Martins e os donos do bingo Icaraí, José Luiz da Costa Rebello, Licínio Soares e Laurentino Freire, todos presos na operação.

No dia 15 de agosto, o ministro Medina concedeu liminar liberando as máquinas, mas a decisão acabou cassada pela presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ellen Gracie. Nesse meio tempo, o grupo já se articulava para conseguir no STJ uma decisão favorável no mérito do pedido, para não depender da liminar.

A investigação aponta que os integrantes do esquema se reuniram com Virgílio mais quatro vezes - em 16 de outubro, 10 de novembro, 17 de novembro e 23 de novembro -, mas não houve acordo. "Vamos gastar X aqui, 800 aqui, ali... tem que ter um número, fechou a porta", diz Virgílio. Anotações de valores, aliás, foram encontradas no local pela PF. A reclamação apresentada pelos donos de caça-níqueis acabou rejeitada no STJ em 22 de novembro - com voto do próprio Medina.

Virgílio Medina foi ouvido ontem, no Rio, pela juíza Ana Paula Vieira de Carvalho, da 6ª Vara Federal. Ele caiu em contradição com o que falou na véspera Sérgio Luzio. Foi Luzio quem primeiro o procurou, em nome dos bingos, pedindo que atuasse no STJ para liberar os caça-níqueis.

Luzio alegou que os R$ 600 mil sobre os quais os dois conversaram em telefonemas grampeados pela PF referiam-se aos honorários que Virgílio cobraria para atuar no caso. Só depois é que eles teriam "descoberto" que Virgílio estava impedido de atuar, por ser irmão do relator.

Já Virgílio disse que só falou dos R$ 600 mil com o advogado Jaime Dias, lobista da Associação de Bingos. Este dinheiro, segundo ele, seria a cifra que os bingos estariam dispostos a pagar ao escritório que ele, Virgílio, indicasse para atuar na Reclamação ao STJ. Nenhum deles, porém, convenceu os procuradores da República.

Outro que depôs ontem foi o delegado federal aposentado Luiz Paulo Dias de Matos, acusado de repassar à quadrilha informações sobre operações policiais. Também negou as acusações e não soube dizer exatamente com quem falava nos grampos feitos pela PF.

Os depoimentos vão prosseguir até o dia 17, quando haverá a transferência dos acusados para o presídio federal de Campo Grande (MS).


Decisão em favor de banco também sob suspeita

As escutas da PF ainda mostram que o advogado Virgílio Medina teria influenciado outra decisão do irmão, Paulo Medina. O caso envolveu um grande banco, que era processado por uma cliente. Medina foi o relator do caso. O banco era defendido pelo escritório de advocacia Gueiros, Pitta Lima e Ferreira. A PF investiga se Virgílio era sócio oculto ou mantinha outro tipo de relação com esse escritório, que usava para reuniões em Brasília. Considera-se que parte da negociação da liminar que liberou máquinas caça-níqueis foi feita no local. A polícia também apreendeu, no escritório do advogado no Rio, um envelope com o processo do banco. O advogado do irmão do ministro, Renato Tonini, diz que não há nenhum vínculo.

Outro relatório da investigação aponta que o ministro e Virgílio teriam se reunido com os advogados do banco, fato que o advogado de Medina, Antônio Carlos de Castro, também nega. Em uma das conversas interceptadas, Virgílio avisa a Alexandre Pitta, do escritório de advocacia, que está chegando a Brasília. Em consulta ao STJ, a PF constatou que Medina deu parecer favorável ao banco no processo.

AS ESCUTAS DA PF

7 de julho, às 13h16: José Luiz, chamado de Zé, conversa com Sérgio Luzio e diz esperar uma decisão "favorável". Indaga se será um colegiado ou se Medina pode "dar uma porrada".

9 de julho: Zé tem uma conversa com Luzio. "O pessoal do escritório (de Sérgio) deve analisar se tem um valor de sucesso... se não tem sucesso... se vai ser atendido no amor. Enfim, faz parte do escopo comercial... isso tem seus fundamentos comerciais", afirma. "A gente vai lá, externa o assunto e aguarda o momento deles responderem: olha, o custo é esse. Quem vai encaminhar isso é você, diante de um mais oito (a Betec e mais oito empresas da reclamação que seria julgada por Medina)." Por fim, Zé fala de comissões: "A gente acerta aquilo que se conversou, os 30%. Eu abro a porta e digo a você: tá o meu e tá o seu aqui." Sérgio cobra valor maior: "Bota 50%". Mas o interlocutor rebate: "Não, Sérgio, não quero usurpar."

28 de julho, às 14h31: há uma conversa de 2min21 entre Evandro e um homem identificado como Cláudio que relata, em código, o resultado da negociação entre Virgílio e o irmão. "Eu vou te explicar e vê se você entende. A pessoa esteve lá e conversou com ele (possivelmente Virgílio). Ele disse que esteve com a outra pessoa, a principal (Medina). Ela (Medina) disse o seguinte: 'Existe grande chance"... "Ele (Medina) não falou nem sim nem não. Mas deu a entender sim."

31 de julho: Virgílio fala sobre valores com Sérgio, que reclama de Evandro, outro integrante das negociações. "Se tiver alguma gordura nos honorários, a gente vê isso. É importante que tenha uma transparência, uma conduta ética", declara o advogado. O irmão do ministro Medina diz que Evandro "pode estar correndo em paralelo, para estourar valores". "Eu até falei: o valor estipulado para a causa é de R$ 1 milhão. Tem um percentual de 20% na frente (entrada). O negócio tem que ser bom pra todo mundo. Todo mundo tem que estar satisfeito.

1º de agosto: é Sérgio quem liga para Virgílio. "Falei com o Zé Luiz e ele concordou em tirar da parte deles (a comissão) para o negócio fechar logo e eu divido com o Evandro. Fica a seu critério baixar um pouco, fechando (o valor total) em R$ 900 (mil)", diz Sérgio. Virgílio fala da negociação com Evandro: "Falei com ele e ficou em R$ 800 (mil) em vez de R$ 1 milhão (...) Cheguei em R$ 200 (mil), mais R$ 400 (mil), que seria R$ 600 (mil). Se ele (Evandro) conseguir R$ 900 (mil), fica uma margem (maior) para dividir entre vocês." Em seus depoimentos, Luzio e Virgílio alegam que os valores negociados são de honorários.

Fonte: OESP em 05-05-2007.

Bingo, o tema que paralisa 3 Poderes

Súmula vinculante do STF ainda não saiu, Congresso patina e Executivo prefere transferir responsabilidade

Rui Nogueira

A discussão sobre a situação jurídica dos bingos está empacada no Congresso, mas, afora as sentenças óbvias, o escândalo da Operação Hurricane também não fez o Supremo Tribunal Federal (STF) apressar a prometida aprovação da súmula vinculante sobre as decisões em torno do jogo. Na segunda-feira seguinte à operação da Polícia Federal (PF), dia 16 de abril, ministros do Supremo prometeram a súmula para evitar que juízes de instâncias inferiores dêem sentenças favoráveis a bingos, mas, passados 20 dias, a súmula está por votar.

No Executivo, considerações e reflexões públicas à parte, a ordem expressa é não se meter e deixar o governo fora do assunto. 'A questão da legalização ou não dos jogos de azar é do Congresso', disse ao Estado o ministro da Justiça, Tarso Genro (PT). 'O governo é contra a legalização. Não há razão para o governo se envolver num assunto que tem orientação clara do Supremo, que diz que tudo depende da aprovação de lei federal pelo Congresso.'

No Ministério da Justiça, pelo menos um outro alto assessor da cúpula administrativa também tem opinião formada. Para o ex-deputado federal Antônio Carlos Biscaia, atual secretário nacional de Justiça, a solução é a proibição pura e simples de tudo quanto é jogo de azar, bingo e caça-níquel. Um dos procuradores que ajudaram a então juíza Denise Frossard a botar na cadeia a cúpula do jogo do bicho do Rio em 1993, ele é autor de projeto de lei propondo a proibição. Mas, por não ter sido reeleito, ano passado deixou o Congresso. A proposta tramita agora anexada à do tucano paulista Mendes Thame, também contra a legalização.

A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), também não quer o governo envolvido na formulação de nenhuma lei, mas avalia que, dos escândalos da 'bingobrás' ilegal, os poderes podem vir a 'delinear' o que ela chama de 'modelo institucional' para resolver o problema.

Fora os governos militares (1964-1985) e administrações dos anos 30 a 50, governos democráticos sempre começaram agindo pró-legalização e terminaram encurralados em crises que os fizeram desistir de encarar a questão. Generais do regime militar 'estatizaram' jogos de azar ao fortalecer a concentração da administração e dos sorteios na Caixa Econômica Federal (CEF). Getúlio Vargas e Eurico Gaspar Dutra fizeram uma aposta dupla: liberavam alguns jogos e proibiam outros, conforme a conveniência político-eleitoral.

Dos governos Collor e Itamar saíram as leis (Zico e Pelé) que mais aproximaram os bingos da legalização. A PF viu que bingos e loterias estaduais haviam sido encampados pelos bicheiros, o Congresso reagiu com a Lei Maguito, que proibia tudo, e, de lá para cá, o cenário é de indecisão jurídica (veja quadro) e sucessivos escândalos.

Resultado: dos 10 projetos pró-legalização na Câmara, 5 são anteriores ao escândalo Waldomiro Diniz. No ano do escândalo, mais 5 foram apresentados. Estão todos parados.

LEIS E ESCÂNDALOS

Governo Getúlio (anos 30 e 40): Jogo é permitido em cassinos. É criado um sistema de loterias exploradas pela União e por alguns Estados

Governo Dutra (1946): Os cassinos são fechados. Corridas de cavalos e loterias continuam

Governo Jânio (1961): Mantida a proibição aos cassinos. Só a União passa a explorar loterias

Governos militares (1961-1985): As loterias federais são ampliadas. A Caixa Econômica Federal (CEF) administra e realiza os sorteios

Governo Sarney (1988): Constituição diz que só a União pode legislar sobre jogos de azar

Governos Collor e Itamar (1990-1994): Aprovada a Lei Zico. Três determinações abrem portas para a legalização dos bingos e a proliferação de loterias estaduais: a regulamentação da lei seria feita pelos Estados; os bingos podiam operar, desde que parte da receita fosse para confederações esportivas; as loterias estaduais também teriam de reverter receita a programas sociais

Denise Frossard (1993): A juíza sentencia à prisão 14 homens da cúpula do jogo do bicho

Bicheiros na muda: Eles migram do bicho para a exploração legal dos bingos e dos caça-níqueis

Governo FHC (1995-2002): Investigações policiais e uma CPI mostram que bingos e loterias estão na mãos de bicheiros

Lei Pelé: Pelé, então secretário do Desporto, revoga a Lei Zico e cria a Lei Pelé, com duas determinações: bingos podem funcionar, mas as autorizações são concedidas pela União, e não mais pelos Estados; fiscalização também fica a cargo do governo federal; a CEF passa a conceder as licenças de funcionamento dos bingos

Lei Maguito: Aprovada em 2000, revoga a Lei Pelé e manda os bingos fecharem até dezembro de 2002. Os "empresários do jogo" conseguem liminares e mantêm os bingos em funcionamento

Eleições (2002): O candidato Lula deixa claro que vai propor a legalização dos bingos. Nova CPI dos Bingos (2005-2006) mostra que os "empresários do jogo" fizeram doações à campanha de Lula

Governo Lula (2003-2007): Grupo estuda legalização do jogo, propondo que a Receita também ajude a financiar clubes. Congresso ressuscita as Leis Zico e Pelé e propõe, de novo, legalizar bingos

Caso Waldomiro: Em fevereiro de 2004, estoura o escândalo Waldomiro Diniz, ex-dirigente da Loteria do Rio, transformado em assessor de José Dirceu. Quando Waldomiro dirigia a Loterj, o "empresário do jogo" Carlinhos Cachoeira gravou conversa em que cobrava propina para aprovar contratos com o sistema de loterias do Rio

Medida Provisória: MP de 2004 que manda fechar "temporariamente" os bingos e veta importação de caça-níqueis é arquivada no Senado Supremo: Decisões do STF deixam claro que só a União pode legislar sobre o assunto

Operação Vega: Em abril de 2006, PF faz buscas em bingos que trabalhariam com máquinas com componentes contrabandeados. São apreendidos equipamentos da Betec Games

Operação Hurricane: A 6ª Vara da Justiça Federal do Rio - onde, desde 2003, transcorria ação para fechar bingos - autoriza escutas da PF para monitorar lobistas que estariam comprando sentenças. A operação prendeu, em 13 de abril, 25 pessoas

PROJETOS EM TRÂMITE

PL 442/1991: Legaliza o jogo do bicho e cassinos. Está na CCJ da Câmara

PL 1101/1991: Cria loteria de números nos moldes do jogo do bicho, que passa a ser legalizado. Anexado ao projeto 442/91

PL 1212/1991: Retira o bicho da Lei de Contravenções Penais. Anexado ao PL 442/91

PL 3223/1992 - Autoriza entidades desportivas a fazer concursos, sorteios e bingos. Está na Câmara

PL 04652/1994 - Legaliza jogos de azar. Normatiza arrecadação de tributos. Está na CCJ do Senado

PL 3145/2004 - Cria loteria municipal e regulamenta os bingos. Está na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara

PL 2944/2004 - Normatiza o funcionamento dos bingos. Divide em coletivo, individual e eletrônico. Está na Comissão de Turismo e Desporto da Câmara

PL 3262/2004 - Regulamenta os bingos. Pune com base na Lei de Contravenções Penais quem não usar cartelas da Casa da Moeda. Anexado ao PL 3145/2004

PLS 343/2004 - Projeto do Senado, libera cassinos em áreas turísticas da Amazônia, Centro-Oeste e do Pantanal. Aguarda designação da CCJ do Senado

PLS 52/2004 - Regulamenta a exploração dos bingos. Aguarda parecer na CCJ do Senado

PL 7228/2002 - Tipifica como crime contra a economia popular a exploração do bicho e jogos de azar. Está na CCJ da Câmara

PL 270/2003 - Veta exploração de bingos. Está na Comissão de Turismo e Desporto da Câmara

PL 1986/2003 - Proíbe a exploração e prática de bingos, caça-níqueis, jogos do bicho e de azar. Está na Comissão de Turismo e Desporto da Câmara PL 2999/2004 - Proíbe os bingos. Anexado ao PL 270/2003

PL 3492/2004 - Proíbe bingos, jogos de azar e exploração de máquinas eletrônicas. Suspende permissões e concessões para essas práticas. Está na Comissão de Turismo e Desporto da Câmara

PLS 120/2004 - Proíbe a exploração de máquinas eletrônicas, eletromecânicas ou mecânicas. Está na CCJ do Senado

PLS 121/2004 - Proíbe exploração de bingos e caça-níqueis. Está na CCJ do Senado

Fonte: OESP em 06-05-2007.


Na Paraíba, jogo do bicho tem o amparo do governo estadual

Apesar de proibido por lei federal, no Estado banqueiros são credenciados como agentes lotéricos e pagam taxa mensal

Segundo governador, que defende autonomia para Estados decidirem sobre legalização, desde 1967 o jogo é disciplinado na PB

ELVIRA LOBATO
ENVIADA ESPECIAL A JOÃO PESSOA

Não parece o mesmo Brasil. Enquanto no Rio de Janeiro banqueiros do jogo do bicho são presos, acusados de corromper membros da polícia, do Judiciário e de envolvimento com assassinatos e exploração de caça-níqueis e bingos, na Paraíba o jogo é amparado pelo Estado há mais de 40 anos.
Os bicheiros da Paraíba querem ser referência para um debate nacional sobre a legalização do jogo. A atividade é proibida pela Lei das Contravenções Penais, que prevê multa e prisão de quatro meses a um ano para os bicheiros. Os apostadores são passíveis de multa.
A Paraíba é o único Estado a dar cobertura legal para o jogo do bicho. As bancas funcionam com licenças expedidas pela loteria estadual, a Lotep. Os banqueiros são credenciados como agentes lotéricos. Nos demais Estados do Nordeste, o jogo é tolerado, mas sem envolvimento explícito das autoridades.
Segundo o governador Cássio Cunha Lima (PSDB), o jogo é disciplinado pelo Estado desde 1967, por iniciativa do então governador João Agripino Maia. Diz o folclore político que Maia foi chamado pelo comandante do 4º Exército, que lhe ordenou que pusesse fim à jogatina. Ele teria dito ao general que coibiria se a União desse empregos para 4 mil cambistas. O jogo segue livre desde então.
Cunha Lima disse que os banqueiros não o preocupam, e que tem "coisas mais sérias" para cuidar, como o combate à pobreza. Diz que o jogo não está associado à criminalidade no Estado. Questionado se conhece algum dos bicheiros, citou o deputado estadual João Gonçalves, do PSDB. Cunha Lima defende que os Estados tenham autonomia para decidir sobre a legalização do jogo.

Clube do bicho
O jogo do bicho é praticado em lojas, quiosques e nas ruas das 223 cidades da Paraíba. A capital tem 15 bancas autorizadas, que funcionam como organizações familiares. Campina Grande, segunda maior cidade, tem seis. O número de licenças é proporcional à população.
As concessões estão em nome das pessoas físicas dos bicheiros, cadastrados como agentes lotéricos. Algumas licenças foram expedidas há 40 anos. Quando os banqueiros morrem, a direção do negócio é assumida pelos filhos ou viúvas, mas a licença de funcionamento fica no nome do fundador. Há ao menos três bicheiros já falecidos que continuam como concessionários do serviço.
Cada banca paga uma taxa mensal para custeio da Lotep. A taxa varia segundo o potencial de arrecadação do município, sendo de R$ 6 mil mensais, por banca, na capital. Os três sorteios diários do jogo são feitos nas dependências da Lotep, em um auditório aberto ao público. Os resultados são anunciados pela rádio oficial do governo.
Para evitar disputas por pontos de exploração, os bicheiros têm uma cooperativa, também informal, a Banca Para Todos, que é presidida, há 15 anos, pelo advogado Geraldo Gomes de Lima, dono de uma banca.
Entre os bicheiros, há dois militares reformados do Exército, um ex-funcionário público, um deputado estadual e um candidato a deputado federal derrotado. A maioria, porém, é de comerciantes que herdaram dos pais os pontos do jogo.

Divisão do bolo
A receita apurada na venda das apostas é rateada entre associados da Para Todos após o pagamento dos prêmios e dos cambistas, que ficam com 20% das vendas. Das 15 bancas em João Pessoa, só duas não fazem parte da cooperativa.
Como as concessões são em nome das pessoas físicas, e a cooperativa não tem registro público, cada banqueiro tem uma carta-testamento guardada no cofre da Para Todos, em que nomeia seu sucessor e a distribuição de suas cotas entre os herdeiros. Quando um bicheiro morre, o presidente da cooperativa lê a carta na presença dos demais e das famílias, para que a determinação do morto seja conhecida e se cumpra a máxima do jogo do bicho de que vale o que está o escrito.


Procuradoria da República questiona autonomia do Estado para explorar jogo

DA ENVIADA A JOÃO PESSOA
O poder do Estado para autorizar o funcionamento do bicho começa a ser questionado pela Procuradoria da República. No mês passado, o procurador federal Roberto Moreira de Almeida, a pedido da procuradora-geral de Justiça do Estado, Janete Ismael, abriu processo administrativo para investigar se a lei que criou a Lotep lhe dá poderes para autorizar a exploração do jogo do bicho, como sustenta o Executivo, e se as licenças são válidas ou não.
Para Almeida, o Estado extrapolou na interpretação da lei, que permitiria o funcionamento da Lotep, mas não o credenciamento de agentes para exploração de jogos.
Se for confirmado seu entendimento inicial, ele disse que pedirá ao procurador-geral da República que entre com Ação Direta de Inconstitucionalidade no STF contra a lei estadual que, supostamente, respalda a legalização do jogo na Paraíba.
O processo pode abrir caminho para a legalização do jogo em outros Estados, ou empurrar os banqueiros do bicho da Paraíba para a clandestinidade.
O presidente da Para Todos, Geraldo Gomes de Lima, diz que as bancas de bicho faturam, em seu conjunto, cerca de R$ 200 mil por mês, na capital, e que a atividade está em declínio por atrair apenas o público mais velho. A informação parece subestimada. A Folha ouviu vários apontadores de jogo na capital, nas proximidades do Palácio do Governo e da Assembléia, que disseram que a média diária de apostas, por ponto, é de R$ 200 a R$ 300.
Gomes de Lima disse não haver caixa dois nas bancas do jogo, e que os banqueiros declaram seus rendimentos ao Fisco. Porém, não há contabilização formal da receita do jogo, por ser contravenção. O diretor-superintendente da Lotep, Roberto Rabello, disse que o Estado não fiscaliza a contabilidade do jogo, só o pagamento dos prêmios aos apostadores.

Fonte: Folha de São Paulo em 06-05-2007.


Supremo recebe reclamação da PGR sobre exploração de jogos de azar em Santa Catarina

04/05/2007 - 18:44 - O procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, ajuizou Reclamação (RCL 5141), com pedido de liminar, no Supremo Tribunal Federal (STF). Ele contesta o Decreto nº 76/07, editado pelo governador do estado de Santa Catarina e, também, as Resoluções 1061 e 1062, da Companhia de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina (Codesc). Estes atos, ao admitirem a exploração de jogos de azar no estado catarinense, teriam descumprido decisão do Supremo na ADI 2996.

Conforme a ação, em 16 de fevereiro de 2007, ou seja, dois meses após o julgamento dos recursos interpostos pelo estado de Santa Catarina na ADI 2996, o governador catarinense "portou-se de maneira diametralmente oposta à autoridade da decisão então proferida pelo Plenário da Suprema Corte". Isso porque, de acordo com o procurador-geral, o conteúdo do decreto evidencia que "a companhia toma para si a administração da loteria do estado de Santa Catarina, com boa parcela das competências que vinham tratadas na Lei 11.348/00, declarada inconstitucional".

Antonio Fernando Souza alegou que o governador de Santa Catarina "deixou de lado a explícita declaração de que não se admite, por obra do poder público estadual, a subversão da competência federal quanto ao que toca à regulação de jogos de azar". Segundo o procurador-geral, "à míngua de legislação de âmbito central, vedado está o comportamento estadual, em qualquer sentido".

Pedido

Ao pedir o deferimento da liminar, o procurador ressaltou que estão presentes, no caso, o interesse público, o grave risco de lesão irreparável, bem como "a preservação da supremacia da Constituição e da autoridade das decisões proferidas pelo Supremo". Assim, liminarmente ele requer a suspensão da eficácia do Decreto 76/07, cassando de imediato os efeitos das Resoluções 1.061 e 1.062 da Codesc e, ao final, pede a procedência da Reclamação para que os atos questionados sejam cassados definitivamente.

EC/LF

Fonte: S.T.F. em 05-05-2007.