Juiz restringe comerciais de cerveja

Liminar concedida 6.ª-feira no Ceará determina que TVs só veiculem propagandas de 21 às 6 horas em todo o País

ETIENNE JACINTHO e RENATA GALLO

Verão e carnaval. No período de maior consumo do ano, a indústria de cerveja teve a publicidade limitada na televisão anteontem. O juiz Jorge Luís Girão Barreto, da 2ª Vara da Justiça Federal do Ceará, determinou que a propaganda de cerveja só pode ser veiculada entre 21 e 6 horas, mesmo assim com advertência de que o consumo de bebida alcoólica provoca dependência química e psicológica. A liminar (de caráter provisório), vale para todo o País.

As três maiores cervejarias, Ambev, Femsa e Schincariol, que movimentam milhões em marketing no carnaval, só poderão recorrer da liminar no Tribunal Regional Federal, 5ª Região, com sede no Recife. Os dados de gastos em marketing são sigilosos, mas a verba total das três grandes nesse setor ultrapassa a casa do bilhão. Para se ter uma idéia do volume de dinheiro em jogo, só a Ambev, dona de marcas como Skol, Brahma e Antárctica, gastou R$ 350 milhões em propaganda em 2003. A Schincariol, no mesmo período, investiu R$ 120 milhões. A estimativa é de que o valor tenha duplicado em relação àquela época.

A restrição da propaganda ao período noturno é resultado de ação movida por uma entidade especializada na recuperação de dependentes químicos, o Desafio Jovem do Ceará, que entrou com uma ação civil pública pedindo a restrição. De acordo com a liminar, anúncios que não se adequarem às regras serão retirados do ar e as empresas estarão sujeitas a multa de R$ 100 mil por dia. O Desafio Jovem também pediu que o juiz obrigasse as empresas a informarem os gastos nos últimos seis meses de 2006 com propaganda. Mas o juiz ainda não acolheu essa solicitação.

A proibição deveria ter validade apenas no Ceará. No entanto, o juiz alega que seria inviável determinar que a exceção fosse cumprida. Dessa forma, a liminar passa a valer para todo o País.

Especialista e um dos pioneiros no Brasil no tratamento de dependentes químicos, o fundador do Desafio Jovem, o médico Silas de Aguiar Monguba, diz que a dependência alcoólica é a mais difícil de ser combatida por ser o álcool 'uma droga socialmente aceita'. O advogado da entidade, Francisco Maia, em entrevista ao jornal cearense O Povo, observou que, da forma como são feitas hoje, as propagandas estão 'enganando' o consumidor. 'O que a gente gostaria é que elas (as empresas de cerveja) fossem leais ao consumidor. Eles têm obrigação de dizer que o álcool provoca a dependência química.'

Maia disse também que o Desafio Jovem deve pedir que as empresas de cerveja dêem uma contrapartida para as entidades de recuperação subsidiarem gastos com dependentes químicos. A expectativa do advogado é de que, mesmo que as empresas entrem com recurso, a Justiça conceda um parecer favorável à entidade, uma vez que a decisão da 2ª Vara não proíbe a divulgação das propagandas, apenas as restringe. Ontem à tarde, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região não confirmou informações de que teria cassado a liminar.

A Rede Globo e a TV Record afirmaram que ainda não receberam notificação sobre a liminar. A Central Globo de Comunicação, CGCom, disse que, enquanto a decisão não chegar ao conhecimento do departamento jurídico da emissora, as inserções comerciais seguirão sem restrições. O superintendente comercial da Record, Walter Zagari, acredita que, se não houver cassação, a liminar deve chegar às redes de televisão 'provavelmente só depois do carnaval'.

A direção da Ambev informou que não comentará a decisão. A assessoria da Schincariol ressaltou que ainda não foi notificada e a da Femsa não foi localizada. COLABORARAM

Fonte: OESP em 18-02-2007.