Entrevista nº 2

A AMATA agradece ao Dr. Mário Albanese pelas impressindíveis informações, em especial às autoridades públicas, a respeito da questão do tabaco na nossa sociedade.

Advogado, músico e ambientalista, Mário Albanese é conhecido por, além de ter criado um ritmo musical, o Jequibau, haver fundado, juntamente com o advogado paulista Luiz Mônaco, a Associação de Defesa da Saúde do Fumante - ADESF, após ter recebido uma procuração para tanto do saudoso Prof. Dr. José Rosemberg. É membro da Coordenação Estadual de Controle do Tabagismo - CETAB da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, e da Câmara Técnica de Combate ao Tabagismo do Conselho Municipal de Políticas Públicas de Drogas e Álcool - COMUDA da Secretaria de Participação e Parceria de São Paulo.

AMATA (por seu Presidente) Dr. Mário, a grande maioria dos ativistas na área da saúde passaram por experiências pessoais. Este também foi o seu caso?

M. A. – Caríssimo Sílvio, Biagio Albanese, meu pai, morreu com apenas 59 anos de idade de angina pectoris. Fumava três maços diários de cigarros e não tinha sequer cabelos brancos. Foi uma perda sentida e que aconteceu seis meses depois da operação, simpatectomia, que salvou-lhe a perna e também a vida. A advertência dos médicos que o assistiam, Dr. Mário Degni, extraordinário operador, e Dr. Tranchesi, renomado cardiologista, foi clara e incisiva: "se o seu pai voltar a fumar, morrerá em seis (6) meses". Realmente, morreu aos 19 de junho de 1957 fumando "Cubanos", um quebra-peito sem filtro...
Àquela época o fumo era incensado pelo cinema e por todos os meios de comunicação. Ignorava-se completamente os malefícios do fumo; portanto a minha missão da fazê-lo parar de fumar foi mesmo impossível. Por muitos anos carreguei esse complexo de culpa que se expressava no uso de uma gravata preta em sinal de luto por sua morte.

AMATA O Judiciário brasileiro, tristemente, diversamente de outros países, vem negando na maioria dos casos ganho de causa aos consumidores que se sentiram lesados pelo consumo do tabaco. A Ação Coletiva da ADESF pode significar uma análise mais acurada desse assunto pela Justiça brasileira?

M. A. – Da morte de meu pai para cá pouca coisa mudou. As mortes sob encomenda acontecem na cara dura com o fisiologismo do lobby das tabaqueiras para convencer a sociedade de que o cigarro faz bem à saúde, pricipalmente à saúde econômica do país. Com esse objetivo faz ajustes escabrosos, estabelece alianças, contrata, financia, compra, e, com esses meios mente o tempo todo! O erro é não reagir e não fazer nada diante das manhas e artimanhas desse comércio sórdido de viciar seus consumidores.
Creio que estou tentando fazer a minha parte. Afinal, sou um músico e advogado com capacidade e conhecimentos suficientes para interagir com médicos especialistas, e isso é muito bom pois gera a especialização interativa. De fato, a "Intractional Espertize" amadurece o conhecimento. Isolados, os poucos que se empenham na luta antifumo carecem de apoio e aguardam uma atitude incisiva que promova uma efetiva reação da sociedade. As tabaqueiras assediam a imprensa, o judiciário e o legislativo com seu indisfarçável lobby financeiro... O executivo tudo assiste e não faz nada para conter essa ganância incontrolada. Entendo, caríssimo Sílvio Tonietto, que o roteiro de solidariedade ao trabalho da ADESF ganhou muito com sua adesão, descortino e apoio. Infelizmente, a arbitrariedade dos que lidam com a lei, reflete-se no acúmulo de contravenções e irregularidades que fomentam a corrupção. O empenho em conscientizar o público da importância de sua participação no processo da ADESF é árduo e espinhoso pois a omissão replicada é inadmissível e ofende a dignidade de todos.

AMATAA responsável pela conta da Philip Morris em uma determinada agência publicitária, em 2002, disse que "enquanto o governo permitir" eles estarão trabalhando para manter as marcas dos seus produtos vivas na mente dos seus consumidores. É possível à sociedade dizer não à instigação desse consumo?

M. A. – Quando os documentos internos das tabaqueiras vieram a público, descobriu-se também afirmações como “estamos no negócio de vender nicotina, droga causadora de dependência” (Addison Yeman, Vice-Presidente da Brown and Williamson - documento secreto de nº 1802.05), “considere o maço de cigarros como um recipiente para o fornecimento diário de nicotina” (Philip Morris, 1972) e “temos que nos conscientizar de que nossa organização é antes uma indústria de drogas, que uma indústria de tabaco” (Rullin A Crellin, Chefe do Grupo de Pesquisas da British American Tobacco, 11.04.1980).
É indispensável redescobrir o verdadeiro sentido da luta antifumo. A participação da sociedade, sob múltiplas formas, é absolutamente necessária.
Reflexão às palavras de Martin Luther King:
“O que mais preocupa não é o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem caráter e sem ética. O que mais preocupa, é o silêncio dos bons...”

AMATAMuito obrigado.

Outubro de 2006.