Entrevista nº 4

A AMATA agradece à Jorn. Eliana Thomé pela gentil entrevista concedida sobre outra questão de real importância para a Saúde Pública: a publicidade da bebida alcoólica em nossa sociedade.

Jornalista com pós-graduação na França, onde viveu quatro anos, Eliana Thomé é professora de francês e articulista de revistas especializadas em Ciência, Filosofia e Religião. Foi crítica de cinema durante 10 anos e trabalhou em vários jornais e revistas (Veja, Isto É, A Tribuna de Santos, Diário Popular). Na França, trabalhou na Rádio França Internacional - RFI, e começou um Doutorado em Cinema (o primeiro do país), cuja tese teve por tema: 'A Introdução do Cinema Novo na França dos anos 60'.

AMATA (por seu Presidente) Sra. Eliana, quando crimes bárbaros como o do menino de 6 anos João Hélio Fernandes ocorrem, toda a imprensa e o parlamento se manifestam. Todos os dias, contudo, vemos parentes perderem pessoas inocentes vitimadas em razão de produtos como o tabaco ou a bebida alcoólica. Não existe uma falta de atenção da sociedade em relação a problemas potenciais como o do caso relatado na entrevista anterior?

E. T. – Dificilmente existe uma família que não esteja afetada por um dos problemas acima, quando não pelos dois ao mesmo tempo. Em nossa família perdemos um irmão maravilhoso, grande profissional, mas partiu prematuramente aos 40 anos em conseqüência de álcool aliado a um problema de diabete. Ele achava que podia controlar a bebida. Dizia que bebia porque queria e pararia quando quisesse. Jamais conseguiu, pois a dependência é sutil e mortal e dá a falsa impressão de controle ou do que chamam “beber socialmente”. Eis uma coisa que a sociedade e os órgãos oficiais deveriam atentar. Hoje se incentiva abertamente a beber, associando o álcool ao sucesso, à conquista, à alegria e à autopromoção.

AMATA Pessoas formadoras de opinião em comerciais de cerveja, como, por exemplo, nos últimos tempos, atores e atrizes, pagodeiro, apresentador de programa de televisão, jogadores de futebol, técnico de futebol, cantora, etc, ao fomentar o consumo do álcool, não possuem uma parcela de responsabilidade em relação às vítimas desse tipo de bebida, levando-se em conta, outrossim, Parecer do Conselho Federal de Nutricionistas - CFN publicado na Revista do CFN Nº 20/2006, p. 13, registrando que em 2001 foram efetuadas 84.467 internações para tratamento de problemas relacionados a alcoolismo no Brasil, com média de 27,3 dias de internação, a um custo de 60 milhões de reais para o Sistema Único de Saúde (SUS)?

E. T. – Essa pergunta me faz lembrar do escritor russo Leon Tolstói (1828-1910) por ocasião de uma psicografia por intermédio da grande médium Yvonne A. Pereira (1900-1984).
          Conta ele que as mortes dos leitores com tendências suicidas que findam por praticar o ato macabro inspirado pelo trágico fim da sua personagem Ana Karênina, cujo adultério acaba conduzindo-a ao suicídio, repercutem fortemente nele no plano espiritual, como se fosse co-responsável pelo delito.
          Analisando o fenômeno ele alerta a todos os seres que trabalham com a escrita para a responsabilidade daquilo que passam aos seus leitores e ao mundo. Pois muitas são as almas ainda fracas e sugestionáveis precisando de apenas um empurrão para justificar uma fraqueza ou um vício.
          Podemos estender a mesma advertência à publicidade que não mede esforço e luxo para vender o seu produto abertamente, como se não provocasse nenhuma conseqüência ou dependência, a exemplo do álcool.

AMATAOs marqueteiros sobreviveram à eliminação da propaganda de cigarro na televisão. Sobreviverão a essa mesma proibição em relação à bebida alcoólica?

E. T. – Você pontuou bem em seu livro "Responsabilidade Civil Objetiva por Dano Provocado pelo Tabaco no Código de Defesa do Consumidor" que a exploração econômica do tabaco é muito pequena em relação à economia como um todo. O mesmo é possível que valha para a bebida alcoólica.
          Os espaços publicitários na televisão, assim como nas rádios, revistas e jornais, continuarão existindo, a exigir uma criatividade e qualidade cada vez maior desses profissionais na atividade publicitária.
          Mas a pergunta que importa é: se não existisse bebida alcoólica a humanidade continuaria existindo? Como podemos ver é um produto totalmente descartável na vida e para a nossa saúde.
          Não estamos fazendo apologia contra o álcool. Apenas queremos mostrar o quanto dispensável ele é. Coisa que a publicidade ignora, colocando-o como essencial para a nossa felicidade. Como se dependêssemos disso para sermos felizes.
          Vimos recentemente uma campanha que colocava idosos reiniciando a vida sexual após experimentarem algumas doses de cerveja. Uma publicidade de extremo mau gosto que foi violentamente repudiada pelo público e até por alguns meios de comunicação.

AMATAMuito obrigado.

Abril de 2007.